terça-feira, 30 de outubro de 2012

DF Wallace: Infinite jest em tradução


Salvato Telles Menzes e Vasco Menezes, pai e filho, estão a traduzir uma piada, mas uma piada com mais de mil páginas. À razão de 5 páginas por dia X 2, “Infinite Jest” de David Foster Wallace está a transformar-se em “A piada infinita”.

quinta-feira, 18 de outubro de 2012

Alexandra Lucas Coelho: E a noite roda


Depois dos relatos de viagem “Tahrir” e “Viva México”, Alexandra Lucas Coelho volta a Portugal para apresentar “E a noite roda”. É o seu primeiro romance, e é também um regresso ao Médio Oriente e a Jerusalém, onde chegou a ser correspondente do Público. O que é que acontece ao amor, num cenário de conflito, de muros e separações? E o que é que acontece à experiência jornalística, quando é invadida pela paixão?

Manuel António Araújo: o rapaz que lia Rimbaud


O apocalipse de uma personagem sem libido por mulheres, ou o calvário do sexo


Tomás da Fonseca: religião, república, educação


Portugal já teve o seu Pussy Riot: odiava a fornicação entre Estado e Igreja: e pagou por isso. Chamaram-lhe “o diabo em pé”

segunda-feira, 8 de outubro de 2012

Lady Gaga


[publicado originalmente no suplemento do Público P2, em apresentação ao concerto de Lady Gaga no Pavilhão Atlântico, em Lisboa]

Heroínas: ser mulher não basta


Uma exposição que é uma tomada de poder, primeiro simbólica, depois definitiva, da mulher representada na pintura. Em “Heroínas” – no Museu Thyssen, Madrid – os arquétipos do feminino herdados de um mundo de homens são reunidos, revisitados, desconstruídos e reconstruídos para dar a ver a Cidade das Mulheres.

domingo, 7 de outubro de 2012

Platónov: a escavação


Alegres e enterrados: com Platónov regressamos à paródia macabra da ilusão soviética, às delícias e fantasias da grande arte literária.

sexta-feira, 5 de outubro de 2012

George Orwell: livros e cigarros

O filósofo norte-americano Richard Rorty considerava Vladimir Nabokov e George Orwell os escritores de língua inglesa mais importantes do séc. XX. Ambos abominavam o poder (ou a crueldade subjacente ao exercício do poder) e desprezavam os idólatras do poder (“snobs” no vocabulário de Orwell, “filisteus” na versão nabokoviana). Dito isto, o percurso dos dois não podia ter sido mais oposto. Nabokov seguiu uma via apolítica e individualista, Orwell manteve-se politicamente envolvido: “Não existe literatura genuinamente desligada da política”. 

quinta-feira, 4 de outubro de 2012

José Eduardo Agualusa: o lugar do morto


Agualusa veste as calças de 25 grandes escritores, mas precisa de mandar fazer bainhas.

Manuel António Araújo: a aldeia das mulheres


Há sexo na aldeia: crónica de uma aldeia transmontana, matriarcal e fogosa.

Paul Verhoeven: Jesus da Nazaré


O realizador de Robocop dá-nos um Jesus humano, demasiado humano. De Deus, resta a palavra.

Julian Barnes: nada a temer


O título engana: Barnes tem pavor da morte

Daniel H. Pink: Drive


De acordo com Mr. Pink estamos a assistir ao crepúsculo do dinheiro como motivação. Outros valores cantarão.

Robert Walser: histórias de imagens


Robert Walser aprendeu a ver olhando o irmão pintar. A pintura entrou-lhe na escrita, no lugar do amor.

Milan Kundera: um encontro


O romancista é famoso. Com bonbons e granadas, o crítico é melhor.

Honoré de Balzac: O Coronel Chabert


Um soldado é desenterrado de entre os mortos para viver enterrado entre vivos.

quarta-feira, 5 de setembro de 2012

Cláudio da Silva: a morte de um caixeiro viajante


Cláudio da Silva desenterra o “overacting” sem beliscar o arrebatamento e as grandes emoções do velho teatro psicológico.

quarta-feira, 29 de agosto de 2012

Turguénev: fumo


No seu ranking pessoal dos grandes escritores russos, Vladimir Nabokov, o professor, colocava Tolstói em primeiro lugar, Gógol em segundo, Tchékov em terceiro e em quarto, já fora das medalhas, Ivan Turguénev (1818-1883).

Cortázar: papéis inesperados


Em 2006, em Paris, Aurora Bernardez descobriu, no escritório onde trabalhava o marido, o escritor argentino Júlio Cortázar, uma “gaveta transbordante” da cómoda com “um monte de manuscritos e textos dactilografados originais”

Agamben: nudez


Do filósofo italiano Giorgio Agamben (Roma, 1942), foi traduzido em 1993 um livrinho, “A comunidade que vem” (ed. Presença), que fez do seu autor um fenómeno de culto entre a comunidade artística portuguesa.

Benchley: wit


A expressão inglesa “pay the deeds”, que “prestar homenagem”, ou “pagar dividendos” não traduzem com rigor, designa a necessidade de um artista de sucesso repartir os louros com aqueles que maior influência exerceram sobre o seu trabalho. Não sei se foi essa a intenção de Ricardo Araújo Pereira,

AK Tolstói: o vampiro e a família do vampiro


Dois contos oitocentistas sobre vampiros: O horror! O humor!

Ujica: autobiografia de Nicolae Ceausescu


Ceausescu transformou a Roménia numa colossal produção cinematográfica. Andrei Ujica oferece-nos um retrato do ditador enquanto realizador e actor principal de um país. 

P. Bruckner: o paradoxo amoroso


O trabalho de Pascal Bruckner (Paris, 1948) oscila entre reflectir sobre a relação do pensamento ocidental com o resto do mundo, e sobre aquilo a que podemos chamar as ideologias da sociedade contemporânea.

John Newsinger: George Orwell


John Newsinger inicia o primeiro capítulo desta biografia política, originalmente publicada em 1999, com uma frase que se revelará edipiana: "Eric Blair foi um filho do Império". A vida de Eric Blair (1903-1950) e a obra do seu pseudónimo George Orwell foram uma caminhada até à extinção das colónias britânicas em que nasceu e cresceu.


Ana Teresa Pereira: Inverness


Na pág. 103 de “Inverness” (ed. Relógio d'Água) somos presenteados com uma sinopse de “Inverness: “A história de uma actriz que representava o papel de outra mulher e se transformava nela.”

Calvino: a especulação imobiliária


Escrito entre 5 de Abril de 1956 e 12 de Julho de 1957 (é com esta datação precisa que termina o livro), “A especulação imobiliária” (ed. Teorema) é o terceiro livro de Italo Calvino (1923-1985). Foi publicado depois de “O barão trepador” e antes de “O cavaleiro inexistente”, com o qual terminou a trilogia fantástica iniciada em “O visconde cortado ao meio”. De acordo com o autor (cito a introdução montada pelo tradutor, a partir de três depoimentos de Calvino) é “a história de uma derrota


Vila-Matas: diário volúvel


Entre 2005 e 2008, o escritor catalão Henrique Vila-Matas (Barcelona, 1948) publicou uma série de crónicas na edição dominical do El País. Com essa matéria, mais alguns textos inéditos do seu diário, trabalhou a versão em livro de “Diário Volúvel” (Teorema), um assombroso itinerário da não-vida do autor

Fante: a Primavera há-de chegar, Bandini


Delícias e torturas de ser católico: o pecado e as privações causadas pelo desemprego, numa obra-prima da literatura italo-americana.

Muriel Spark: Memento mori


Até que a morte os separa: A velhice, a perversidade, a graça e a tortura familiar por uma católica convertida, contemporânea de Greene e Waugh

Tolstói: Anna Karénina


Tenho inveja de quem nunca leu Tolstói: ainda lhe resta essa grande maravilha nesta vida que é descobri-lo.


Tanizaki: uma gata, um homem e duas mulheres


“Querida Fukuko”. Esta pequena novela – tão perfeita e deliciosa como uma refeição completa em miniatura – inicia-se com uma carta.

Pinto Ribeiro: É Março e é Natal em Ougadougou


António Pinto Ribeiro (Lisboa, 1956) é mais conhecido pelo seu trabalho como programador e gestor cultural, mas também escreve

Lobo Antunes: sôbolos rios que vão


As peças acumulam-se e é uma tentação encaixar a nova peça do puzzle às restantes já existentes (este é o seu 22º romance). Outras tentações interpretativas provocadas pelo novo livro de António Lobo Antunes (Lisboa, 1942): o título camoniano, que cita o primeiro verso de Babel e Sião (esse mesmo em que tudo é “bem comparado, Babilónia ao mal presente, Sião ao tempo passado”); e a autoreferencialidade (a personagem principal é um “Sr. Antunes”, que em criança tratavam por “Antoninho” e que no ano de 2007 foi operado a um cancro no intestino).



DF Wallace enquanto experiência religiosa



Porquê escrever tanto, e tão bem, ao ponto da anulação humana? Admirar com fervor David Foster Wallace não é difícil. O escritor imenso rivaliza com a personagem trágica. Difícil é conciliar o superhomem da palavra com a superfragilidade de quem escrevia. Catorze anos depois de “Infinite Jest” (o romance que transplantou um coração para o corpo frio e irónico e autoconsciente do pós-modernismo), dois anos após a sua morte, DFW continua inédito em Portugal e há tanto por onde escolher…

Mário de Carvalho: a arte de morrer longe




Mário de Carvalho (n.1945, Lisboa) começou a publicar o seu trabalho aos 36 anos; em 86 lançou uma paródia ao romance de época, com “A paixão do Conde Fróis”; em 94 teve o seu primeiro sucesso com um falso romance histórico, “Um Deus passeando pela brisa da tarde”; e no ano seguinte escreveu “Era bom que trocássemos umas ideias sobre o assunto”, sobre um homem que não é de esquerda mas decide aderir ao PCP durante a sua pior crise. “A arte de morrer longe” (ed. Caminho) hesita entre a paródia-que-é-metáfora-do-país de “Fantasia para dois coronéis e uma piscina” (2003) e a abordagem mais intimista de “A sala magenta” (2008). A Lagoa Moura, cenário do seu romance anterior, é de resto revisitada para um mergulho a dois (cineasta + tartaruga), na sequência do qual o autor reúne as personagens de ambos os livros.

Este seu novo livro auto-inclui-se num novo género literário, o “cronovelema”, e tem como protagonista “um certo jovem casal desavindo, morador ao Lumiar, convencido, por esses dias, de que a sua ‘comunhão de vida’ (luminosa formulação legal) estava a dar as últimas” e passa-se “antes da fase do divórcio, de que anteviam maçadas burocráticas e tortuosidade jurídicas”.
Ou talvez não. Talvez a personagem principal seja a tartaruga de que o casal procura livrar-se ao longo de 115 páginas, por razões mais palpáveis do que o motivo que leva Arnaldo e Bárbara, “que andavam pelos trinta anos”, a querer o divórcio: “Para além do facto de ser um animal com um poder de sedução discutível e que dava pouco azo a empatias, não podia sentir-se livre nem realizado, já com um tamanho daqueles, num aquário tão estreito. E a verdade é que a infelicidade dos nossos animais interfere com a nossa e chega mesmo a causar grandes amuos.”
Ou talvez não. Talvez seja a “bela e nunca por demais celebrada cidade de Lisboa, urbe das urbes, afamado remanso de brandura, nimbado de zimbórios e palmeiras” e onde “a moda das tartarugas exóticas começou um dia a fatigar”.
Ou talvez não. Talvez a única personagem deste livro seja a de um escritor que quer continuar a escrever sobre aquilo que o rodeia, mas que também o incomoda, ou aborrece, e por isso disserta, deambula, perora, esquiva-se. “A arte de morrer longe” parece resultar do mal-estar provocado por um autor saturado com o universo que ele próprio elegeu. Isso revela-se em diálogos tíbios e ilustrativos, cenas a servirem como demonstração, num humor forçado e sem graça. Subsiste uma impressão de casa desarrumada que se deve menos ao acompanhamento reticente e elíptico das personagens do que à estrutura chiante do livro, com comentários, generalizações e notas sobre literatura a substituírem a composição das cenas.
Mário de Carvalho tem de haver-se com personagens desagradáveis, com os seus coloquialismos pedantes e jargão parolo, com a sua “leva de rancores e recriminações”. Concedemos: é tarefa aborrecida. Opta então por resumos ilustrativos das suas relações desadequadas e animosas, como se fossem superficiais e postiças. As personagens não comunicam as razões da sua infelicidade e mesquinhez, mas é o autor que parece impor-lhes essa impotência.
A narração, gongórica, truculenta, é tão feia quanto os hábitos desenxabidos de uma certa contemporaneidade (fala-se muito de internet e redes sociais; curiosamente as relações estão resumidas à família e ao trabalho). E quando o narrador-autor afirma que “o nosso legislador é abstracto e geral, tão abstracto e geral que se desinteressa do que sejam dez metros, dezassete metros, quanto mais cinquenta metros”, nem se apercebe que ele próprio tem a mesma “repugnância comichosa” pelos números, ao comparar a altura de dois colegas de trabalho: “Arnaldo tinha metade do tamanho dele” (deduzimos que o marido de Bárbara tem um metro de altura e o colega dois).
Quando lembra a semelhança entre a situação vivida pelo casal da sua história com a cena inaugural de “Anna Karenina” (em que Oblonski dorme separado da mulher), também não parece aperceber-se do estilo redacção-escola contido nestas linhas devedoras de um conselheiro matrimonial: “naquele casal não existia maturidade que permitisse um exercício recíproco de apaziguamento. Sobrelevavam, por um lado, as exigências de amor-próprio (…) o próprio receio do fracasso, não fosse o esforço de conciliação um passo mal dado, a causar mal entendidos e mais consequências enviesadas” (Nota: Suf menos).
Mário de Carvalho ganhou fama de ser irónico. Tem dias. Há qualquer coisa de “antipatia fininha” entre o autor e as personagens que escolheu. Como se não passassem de cromos que representam uma paisagem humana confusa, descrente e desolada. À semelhança de Quintão Malpique (que o autor propõe como a versão-internet do Palma Cavalão criado por Eça na “Corneta do Diabo”) o livro tem um estilo “largo e folgazão”, e procura inspirar “familiaridade”. O seu “cronovelema” é uma espécie de comentário apenso a uma crónica da portugalidade. Como enunciado nem está mal. O resultado faz lembrar os contadores de anedotas que espetam uma cotovelada no ouvinte, para ele se rir, e depois explicam, para que entenda.
“E aí está como as circunstâncias da tartaruga reclusa, no seu exíguo compartimento, desimpedida de movimentar os membros, a cabeça, e de embater contra as paredes do aquário, evocam a condição humana, livre de esbracejar dentro dos seus limites, mas apenas pressentindo, sem os compreender, e sem atingir as suas verdadeiras naturezas, as vozes, os rumores e os relampejos que há em volta.”
Se “A arte de morrer longe” fosse um disco, era salvo por uma canção: trata-se do parágrafo sobre a loja de ferragens na Rua de S. Paulo, com um diálogo meticuloso entre o cliente especialista e o empregado sabedor do ofício, escutado por um burguês “abatido por tanta ciência”.
(2010)

Tolstói: cossacos



O Cáucaso está para a literatura russa do séc. XIX como o western para o imaginário cinematográfico norte-americano. Com os seus tártaros, tchetchenos e kirguizes-kaissakes no lugar de apaches e sioux, ali se trava o eterno conflito humano entre os imperativos da natureza e os da civilização;

Behan: Nova Iorque



Brendan Behan (1923-1964) não escreveu este livro sobre Nova Iorque – ditou-o. E, de acordo com Enrique Vila-matas, que assina o curto prefácio, “ditou-o espectacularmente bêbado”.