Esta fotografia aconteceu por acaso,
mas cheguei a iniciar um trabalho sobre corridas de automóveis na rua. Durante dois anos desenhei um roteiro de percursos usados para este tipo de competições, mas os resultados não foram bons e mudei de estratégia. Tentei aproximar-me dos adeptos do tuning, que mais tarde ou mais cedo se envolvem em corridas, não as corridas ilegais organizadas secretamente, mas corridas extemporâneas, que resultam de encontros casuais na estrada. Passei a frequentar a oficina de um mecânico que aparelhava este tipo de carros e conheci pessoalmente alguns tuners. Quando um carro de tuning passa por outro dá-se um namoro, testam-se mutuamente e acaba por acontecer uma corrida que tem menos a ver com encontrar um vencedor do que em envolverem-se numa série de provocações. Para os adeptos do tuning (pelo menos aqueles que acompanhei) não interessa a vitória desportiva, eles gostam é de exibir truques de condução, que importunam o adversário e o levam a cometer erros. Fiz o trabalho durante um período em que este tipo de veículos era alvo de grande perseguição por parte das autoridades. Punha-se a questão do anonimato e também não me interessou participar no fenómeno, que começava a ter as suas lendas. Os resultados eram bastante espectaculares, mas não mais do que aqueles que são oferecidos por qualquer jogo de consola. A caução de reportagem alimentava uma aura de realismo e achei melhor não me envolver. Anos depois andava pelas Azenhas do Mar, entregue a outro assunto. Tinha-se dado um aluimento de terras, o que provocou a derrocada de duas casas, havendo mais algumas em perigo. Fiz várias fotografias entre a Aguda e a Praia das Maçãs e sabia que muitas falésias estavam a alterar-se quase de ano para ano, redesenhando constantemente o recorte daquela zona costeira. Nessa noite, numa estrada em cotovelo à entrada das Azenhas, o embate das ondas tinha lascado a falésia, abrindo uma fresta junto ao raile de protecção. Estava ali a tirar fotografias quando se sobrepôs ao barulho das ondas um ruído de motores. O carro que vinha a tentar ultrapassar por fora meteu para dentro para evitar a fissura na curva da estrada, o que provocou o choque e a queda dos carros no mar. Na fotografia, o interior dos carros está iluminado porque os condutores accionaram a luz de piloto ao abrirem as portas para tentarem saltar. É por isso que no meio desta escuridão se conseguem ver as silhuetas dos corpos.
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