terça-feira, 29 de março de 2011

rua dos remédios

Foi a primeira vez que vendi um trabalho para uma campanha de publicidade,
de promoção às festas populares no bairro da Alfama. É uma montagem, não uma encenação. Fiz o enquadramento e com o ponto de vista fixo tirei tantas imagens quanto as que achei necessárias. Foram três semanas de trabalho. Todas as noites, depois do sol se pôr até de madrugada, colocava a câmara no mesmo local. Mesmo com alterações climáticas, céu nublado, noites de lua cheia, a luz nocturna é mais ou menos estável. E é sempre a mesma entrada para a rua dos Remédios. O ponto de vista da câmara é o de quem está sentado num banco à entrada de um bar, numa rua que sobe da estação de Sta. Apolónia em direcção a Alfama. Isso permitiu-me fotografar a rua dos Remédios em contra-picado. De ambos os lados da rua as casas encontram-se em níveis e volumes distintos. Mesmo os telhados têm este efeito de escadaria, que continua ainda nas janelas das águas furtadas. Reparem aqui ao fundo, do lado direito: o telhado vai subindo, primeira janela, segunda e, mais acima, terceira. E em cada janela, em cada porta, há uma pessoa. Não convidei ninguém a posar à janela, embora aceite que em alguns casos as pessoas não estivessem alheias à minha presença. Num plano mais aproximado, temos este grupo de jovens na varanda, logo no início da rua, e sentados nos bancos mais atrás dois velhotes a discutir. Este homem que está aos berros fora do carro discute com o intercomunicador do sistema de segurança, que não o deixa passar. Estão a reparar neste homem encostado à porta da pastelaria, apoiando-se numas muletas enquanto fuma um cigarro? É o mesmo que caminha mais ao fundo na rua, muito curvado. Tem as muletas ajustadas para caminhar como se fosse marreco. Estas manchas transparentes na superfície da imagem, com aspecto de bolhas de sabão, é espuma de cerveja. Um cliente do bar escorregou e a cerveja que tinha na mão voou, com ele (fora do enquadramento) a ir de encontro a uma caixa de electricidade e a estatelar-se no chão. Esta rapariga com uma expressão abismada e que estica os braços no vazio foi fotografada em outro dia, pelo que não assistiu ao acidente, nem tenta ajudar o rapaz invisível que cai. Ela própria tropeçou num marco, na extremidade do passeio. Não chegou a cair porque foi amparada por alguém (também fora de campo) que levou com o vodka dela em cima.

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