domingo, 20 de fevereiro de 2011

jaime roque (1988-2007)

Foram momentos estonteantes de humor destemido e encanto deveras estroina, mas não sem estados da alma (a alma não é uma cadeira em que nos podemos sentar, como foi dito num baile de máscaras). Na sua linguagem de peixe, escreveu poemas, cantou-os mal vestido, por vezes nem vestido. Deixa em casa dos pais um baú de roupa colorida, minúsculas recordações, coágulos, tachas, labaredas. Deixa as clareiras da sua juventude alada, de potros salgados, de pólen aéreo, de abelhas dribladoras, de meigas formigas desencarreiradas e uma andorinha perdida em plena borrasca primaveril. Vai em busca de outras carreiras. De melhor companhia. Já não mora aqui. Não representou um tipo geracional, não se deixou desidratar em celebrações etílicas ou em somatizações psicotrópicas. A sua alegria de viver não foi a da gargalhada brutal por haver uma braguilha aberta na festa, mas a da perspicácia sorridente, ao notar que o mesmo convidado esmagado pela chacota dos primatas compôs o colarinho enquanto procurava um espelho inexistente. Na sua dedicação comprometeu-se a resgatar a fantasia, essa parcela da infância que se desorienta com a mudança de idade e que um dia alguém achou por bem expurgar dos homens, no momento em que mais necessidade tinham dela. (Pai, pára com isso). Deixa-me, filho, mas não me deixes parar. (Cala-te e vem dar um passeio). Sim, vamos, em silêncio, como num jogo de esconde.

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